Adaptação da duração do tratamento para 12 a 16 semanas no genótipo 2 ou 3 da hepatite c com resposta virológica rápida – revisão sistemática e meta-análise de ensaios clínicos randomizados

Resenha do artigo:

Singal AK, Anand BS. Tailoring treatment duration to 12 to 16 weeks in hepatitis C genotype 2 or 3 with rapid virologic response: systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. J Clin Gastroenterol. 2010 Sep;44(8):583-7. doi: 10.1097/MCG.0b013e3181d7a46c. PMID: 20375729.

Estima-se que mais de 5 milhões de norte-americanos sejam portadores do vírus da Hepatite C, sendo que aproximadamente 15-20% dos casos são causados pelos genótipos 2 e 3 do HCV. As diretrizes atuais da Associação Americana para Estudos das Doenças do Fígado (AASLD) recomenda o tratamento dessa população com o uso combinado de interferon peguilado (PEG-IFN) e ribavirina (RBV) por 24 semanas. Entretanto, a resposta viral sustentada (RVS) entre 70-90% levaram pesquisadores a tentar diminuir o tempo de tratamento em indivíduos que negativavam a carga viral após quatro semanas de tratamento (resposta viral rápida, RVR). Os resultados desses estudos não foram uniformes, alguns mostrando eficácia equivalente entre o tratamento mais curto (12-16 semanas) e o tradicional (24 semanas) e outros mostrando menor RVS e maior recidiva viral. A revisão sistemática com metanálise realizada por Ashwani e Bhupinder comparou as taxas de RVS, rediciva viral e desenvolveu sucinta análise econômica dos custos das duas estratégias de tratamento.

A estratégia de busca foi realizada usando as bases bibliográficas Medline, EMBASEe Cochrane, e plataforma da ISI Web of Sciense, entre os anos 2002 e 2008, sem restrição de linguagem, complementada por busca manual de referências e resumos apresentados nos congressos americano e europeu de hepatologia e americano de doenças digestivas. Foram selecionados todos os ensaios clínicos randomizados que compararam diretamente o tratamento de portadores do HCV genótipos 2 ou 3 com a combinação PEG-IFN + RBV por 12-16 semanas versus 24 semanas e que tivessem seguimento de pelo menos seis meses após o término do tratamento. A busca e extração dos dados foi realizada de forma independente pelos dois pesquisadores e, discordâncias foram resolvidas por consenso. A qualidade dos estudos foi avaliada pela escala de Jadad.

Foram encontrados e avaliados seis ensaios clínicos, envolvendo um total de 1245 indivíduos tratados pelo período reduzido e 1189 pelo período tradicional. Os estudos foram classificados como Jadad 3, com a excessão de um que teve conceito 4 (>=3 são considerados de boa qualidade). Dois estudos utilizaram IFN-PEG alfa-2b e quatro utilizaram o alfa-2a. As doses de ribavirina utilizadas variaram entre 800 e 1400 mg/dia, com ajuste conforme o peso em quatro estudos. As taxas de RVS variaram entre 60 e 95%, diferença possivelmente atribuível a população mais jovem ou com melhor histologia em determinados estudos. A avaliação do desfecho principal, mostra RVS em 70% vs. 79% dos casos, respectivamente para 12-16 semanas vs. 24 semanas de tratamento (Odds ratio (OR) agregada =0,54; IC 95% 0,35-0,85), sugerindo menor taxa de RVS em indivíduos alocados para o tratamento abreviado. Análise de sensibilidade, com exclusão dos estudos com maior e menor OR, aumentou a homogeneidade, mas não modificou marcadamente a estimativa (OR agregada=0,65 IC 95% 0,50 a 0,85). Avaliação por funnel plot não sugere viés de publicação. A taxa de recidiva viralfoi maior entre os pacientes submetidos aos tratamentos com menor duração (OR agregado= 3,12; IC 95%: 1,99-4,91).

Finalmente, foi realizada análise econômica considerando três estratégias: tratamento de todos os 2434 pacientes por 24 semanas (estratégia A), tratamento de 1245 por 14 semanas e 1189 por 24 semanas e retramento de 266 recidivantes por 24 semanas (estratégia B) e, o tratamento de todos os 2434 por 14 semanas e retratamento de 560 recidivantes por 24 semanas (estratégia C). Foi estimado um custo total (dólares americanos) de 46.440.720,00, 41.618.250,00 e 37.775.220,00 respectivamente para as estratégias A, B e C. Considerando-se um custo semanal com medicação de 795,00 por paciente, RVS de 80% para o tratamento por 24 semanas e 70% para 12-16 semanas e recidiva viral de 23% com o tratamento abreviado, os autores estimaram economia de 1460,00 para estratégia B em relação a A, e 2462,00 para estratégia C em relação a estratégia A. Os autores concluíram que ainda que o tratamento de 24 semanas seja mais eficaz, o tratamento abreviado (12-16 semanas) com retratamento por 24 semanas dos recidivantes, pode ser a opção com melhor relação de custo-efetividade.

A metanálise conduzida evidenciou maior taxa de RVS com o tratamento “tradicional” de 24 semanas de PEG-IFN + RBV, comparativamente ao tratamento abreviado. Considerando a diferença na taxa de sucesso das duas opções (80 vs 70%), pode ser razoável optar pelo tratamento abreviado em todos os pacientes, com o retramento por 24 semanas dos 30% que não alcançarem a resposta viral sustentada. Entretanto, a análise econômica desse estudo foi bastante simplificada, considerando apenas o custo direto da medicação. Custos indiretos e o risco de pacientes não aceitarem se submeter a um novo tratamento, em caso de recidiva, são indicadores da necessidade de análise econômica mais detalhada, incluindo adicionalmente outros custos: exames laboratoriais, manejo de complicações e risco de progressão da hepatopatia. Esse estudo é instigante, mas não permite uma conclusão definitiva sobre a relação de custo-efetividade da redução do tempo de tratamento para portadores do HCV genótipos 2 ou 3.

Elaborado por:
Fernando H. Wolf
Sandra C. Fuchs
Data da Resenha:
23/04/2010
Eixo Temático:
Doenças Infecciosas e Tropicais
Eixo metodológico:
Metanálises

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