Aumento do risco de diabetes com tratamento com estatina está associado com a sensibilidade à insulina prejudicada e secreção de insulina: um estudo de acompanhamento de 6 anos da coorte Metsim

Resenha do artigo:

Cederberg H, Stančáková A, Yaluri N, Modi S, Kuusisto J, Laakso M. Increased risk of diabetes with statin treatment is associated with impaired insulin sensitivity and insulin secretion: a 6 year follow-up study of the METSIM cohort. Diabetologia. 2015 May;58(5):1109-17. doi: 10.1007/s00125-015-3528-5. Epub 2015 Mar 10. PMID: 25754552.

O objetivo deste trabalho foi investigar os mecanismos subjacentes ao risco de diabetes tipo 2 associada ao tratamento com estatina na coorte de base populacional síndrome metabólica em Homens (METSIM).

Os participantes foram selecionados da coorte METSIM, composta de homens com idade entre 45 e 73 anos selecionados randomicamente da população registrada de Kuopio, Finlândia. Os 10.197 participantes foram recrutados entre 2005 e 2010 na Unidade de pesquisa clínica da Universidade de Kuopio. Foram feitos teste oral de tolerância à glicose e tolerância à glicose foi classificada de acordo com os critérios da American Diabetes Association. Após a exclusão dos indivíduos diagnosticados com diabetes ou sem o teste oral de glicose baseline, a amostra ficou definida em 8.749 participantes não-diabético. Estes foram acompanhados por 5,9 anos. Casos novos de diabetes foram diagnosticados em 625 homens por meio de um teste oral de tolerância à glicose (TOTG), HbA1c ≥ 6.5% (48 mmol/mol) ou medicação hipoglicemiante iniciados durante o seguimento.

Os participantes em tratamento com estatina (N = 2.142) tiveram um aumento do risco de diabetes tipo 2 de 46% (HR ajustado 1,46 [IC 95% 1,22 – 1,74]). O risco foi dependente da dose de sinvastatina e atorvastatina. O tratamento com estatinas aumentou significativamente glicose de 2h (2hPG) e a área sob a curva (AUC) da glicose, com um aumento significativo na glicemia em jejum (FPG). A sensibilidade à insulina foi reduzida em 24% e a secreção de insulina em 12% em indivíduos em tratamento com estatinas, em comparação com indivíduos sem tratamento com estatina (p <0,01). O tratamento com estatinas aumentou o risco de diabetes tipo 2 em 46%, atribuível a uma diminuição da sensibilidade à insulina e da secreção de insulina.

A introdução demonstra literatura extensamente contraditória sobre o risco de diabetes associado ao uso das estatinas. Os autores citam que um acompanhamento foi iniciado em 2010 e que 5.419 indivíduos participaram. Seria isso uma nova coorte ou seria o acompanhamento de parte dos 8.749 indivíduos? Dado que o recrutamento foi iniciado em 2005, como o acompanhamento dos mesmos pode ter sido iniciado em 2010? E como foi analisado o que ocorreu entre 2005 e 2010? O tratamento com estatinas foi visto nos dados baseline da coorte, no qual não foi verificado o tempo de uso da estatina (apenas se usava e qual a droga em uso), o que pode inferir um viés.

No subitem Statistical analysis, a frase “N=4,679 non-diabetic participants at baseline had follow-up data available, excluding individuals diagnosed with diabetes between baseline and follow-up” Dá a entender que os pacientes da coorte (recrutados de 2005 a 2010) eram a coorte base e que todos os que tinham diagnósticos de diabetes até 2010 foram excluídos. Logo, o 4.679 seria a amostra para análise, que são todos os pacientes da coorte que até 2010 não tinham diabetes e que foram acompanhados de 2010 a 2014 (ou seja, os pacientes recrutados em 2005 tinham informações basais de cinco anos antes do seu tempo inicial na análise).

Seguindo este raciocínio seriam apenas 4.679 participantes da análise, já que os demais foram excluídos por terem diabetes “no meio do caminho”. Porém a figura 1 analisa o risco cumulativo para diabetes em todos os 8.749 indivíduos em 5.9 anos. Esse tempo seria de 2005 a 2010 ou 2014? Não são apresentados os tempos médios e/ou medianos para surgimento da doença, nem as tábuas de probabilidades. Primeiro os autores falam que analisaram o risco para diabetes através da regressão de Cox. Depois relatam que a associação do uso de estatinas com testes de glicose foi feita através de regressão logística linear, ou seja, os fatores foram analisados sem levar em consideração o tempo de uso das estatinas. O modelo escolhido foi ajustado por diversas variáveis. Como foi possível controlar todas essas possíveis alterações de colesterol, triglicerídeos, IMC e etc em 4.679 pessoas, durante seis anos? Não houve perda seguimento numa coorte tão grande?

Nos resultados os autores referem que apenas o uso de sinvastatina em doses altas e baixas e de atorvastatina em doses altas (nisso, são excluídas atorvastatinas em doses baixas e as demais estatinas) aumentam o risco de diabetes após ajuste por fatores de confusão. Os autores optaram pelo modelo ajustado 2, porém apresentam curvas de risco (figura 1) relativas ao modelo 1 que não é ajustado. Além disso não foi testado o modelo 2 incluindo todas as demais variáveis que afirmam ter controlado, concomitantemente.

No trecho “The effects of changes in statin medication were evaluated in 4,786 participants with information on statin treatment at both baseline and follow-up” mais uma vez eles alegam que não tinham informações além da baseline de todos os participantes da coorte.

 Sugerimos que aqui em resultados seja feita a observação de que os próprios autores apontam já um possível viés quando afirmam que: “Risk of type 2 diabetes with statin treatment: At entry individuals who developed diabetes were older, more obese, less physically active, had lower levels of HDL-cholesterol and had higher levels of total triacylglycerols, FPG, 2hPG and HbA1c. Additionally, they were more insulin resistant and had lower insulin secretion than individuals who did not develop diabetes, independently of statin treatment (Table 1).” Além disso pensamos que este texto está fora de lugar (resultados?).

A afirmação de que a terapia com estatinas está associada a um aumento de 46% do risco de diabetes tipo 2 após ajuste por fatores de confusão é muito categórica, como se esse risco fosse um risco atribuível, sem intervalo de confiança e sem interação com outras variáveis. Acreditamos que tal afirmação deva ser cuidadosamente analisada, uma vez que o estudo é passível de críticas.

Elaborado por:
Wayner Vieira de Souza
Joanna d’Arc Lyra Batista
Data da Resenha:
13/04/2015
Eixo Temático:
Hipertensão Arterial/Diabetes Mellitus/Obesidade/Terapias
Eixo Metodológico:
Pesquisas Epidemiológicas

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